Adam Smith e a origem do dinheiro

Uma vez que Adam Smith trabalha e estabelece o que é a divisão do trabalho (o assunto foi tratado no último post), o autor entra em uma questão essencial e ainda tratada de maneira bem mitológica pelos leigos em economia: O dinheiro.

Antes de adentrarmos na explicação sobre a origem e o uso do dinheiro, vale relembrar a importância de se entender o que é o dinheiro. Muitos brasileiros, tem um costume feio de não se aprofundarem no estudo da economia básica e persistirem em mitos em torno de coisas básicas, uma das mais obscuras é a questão do dinheiro.

Frases como "o dinheiro é o mal do mundo" ou "o dinheiro corrompe" são muito comuns, criou-se uma mitologia em torno do dinheiro, mas em maioria por homens que não entendem o que é o dinheiro e como funciona (área geralmente ligada a economia monetária), creio que com uma breve explicação, paremos de ver o dinheiro como uma jóia perigosa e entende-lo como a mera mercadoria que é.

Uma vez que foi instituída a maior especialização do trabalho, em decorrência da Divisão do trabalho, mais difícil se tornou cada homem subsistir-se do próprio trabalho, ora, o ferreiro passou a trabalhar apenas com o ferro, o agricultor com a agricultura e o serralheiro com madeira, como cada um irá sobreviver se a necessidade humana demanda mais do que apenas ferro, madeira ou comida?

Nesse ponto entra uma questão fundamental da humanidade, o comércio. Retomando o que Adam Smith citou no início do segundo capítulo, a "propensão natural do ser humano a permuta", Smith afirma que:
"...Assim sendo, todo homem subsiste por meio da troca, tornando-se de certo modo comerciante e assim é que a própria sociedade se transforma naquilo que adequadamente se denomina sociedade comercial. .."
Ou seja, o comércio, nada mais é que um mecanismo pelo qual a pessoa troca o fruto excedente (que se tornou possível com a acumulação do capital) de seu trabalho, pelo de outrem, através de uma troca onde ambos saiam "ganhando".
Retomando o nosso último exemplo, a maneira mais prática de tanto o ferreiro, quando o serralheiro e o agricultor viverem, é através do comércio, onde cada um trocará o excedente do seu trabalho pelos demais.

E o dinheiro?

Exatamente no ponto das relações comerciais que o dinheiro surge, uma vez que se faz o comércio, se faz necessário algo para ponderar, ou em outras palavras "dar o valor de cada coisa" (o valor nominal, no caso, a questão do valor será trabalhada posteriormente).

Nesse ponto surge uma adversidade grotesca, e se o comércio for impossível?
"Podemos (...) supor que um indivíduo possua uma mercadoria em quantidade superior àquela de que precisa, ao passo que um outro tem menos. Conseqüentemente, o primeiro estaria disposto a vender uma parte de seu supérfluo, e o segundo a comprá-la. Todavia, se esta segunda pessoa não possuir nada daquilo que a primeira necessita, não poderá haver nenhuma troca entre as duas..."
Ao invocar o exemplo, Smith cria a primeira problemática que deu origem ao dinheiro: a questão do desejo.

Ora, ao Agricultor, pode ser que não lhe interesse conseguir madeira, então não haverá comércio, e tanto o Agricultor sairá no prejuízo por ter um excedente que não trará lucro, quanto o lenhador, ficará sem sua comida, então como resolver a questão?

Neste momento, surge a idéia que deu origem ao dinheiro, mas não o dinheiro em si.
A ideia de que existe algo que seja o padrão do comércio e que a todos seja interessante a troca, por ter maior valor, algo que interesse tanto o lenhador, quanto o agricultor.

Durante a história, muitos objetos já foram usados com esse fim, entre eles o gado é um que se destacou.
Logo, ficaria mais fácil que o lenhador troque sua madeira pelo item em questão que interesse ao agricultor, da maneira que o agricultor poderá trocar esse item pelo fruto de trabalho de outro. A mesma lógica de aplica aos tempos atuais, afinal, nos recebemos o dinheiro em salário, e com esse salário temos a opção de escolher o que comprar, já que todos os bens são expressos em valores nominais.

Mas ainda assim, a fase do Escambo encontrou a segunda problemática, a questão da "Divisibilidade" dos instrumentos padrões de troca, exemplo:
Imagina que você pretende comprar 10 kg de sal, e para isso você entrega um boi, correto? Mas imagine se você não quiser consumir os 10kg de sal, e sim apenas 2kg, você vai dividir o boi em 5 e dar um pedaço para ele? Obviamente não, o boi perderia o valor e não seria lucrativo.
Esse problema da divisão e da pouca facilidade em manuseio da "mercadoria de troca" levou as pessoas em sua maioria a adotar os metais como unidade de troca padrão, em geral de destaca os seguintes motivos: primeiro, os metais podem ser facilmente divididos e unidos, logo, não haveria problema quanto a divisibilidade, segundo, o metal tem uma característica bem específica, sua resistência, que permite aos mesmos ser utilizado com pouca deterioração se comparado ao gado ou a alimentos.
Por essas características, os metais passaram a ser usado como moedas, com destaque para o cobre, o bronze, a prata e o ouro. Entretanto, surgiu a terceira problemática: a questão da veracidade.
Como a pesagem de metais era um processo extremamente lento e preciso, até mesmo tedioso, se tornou um problema o uso dos metais brutos para negociação, não eram rara as fraudes, então, pra evitar tais abusos, para facilitar as trocas e assim estimular todos os tipos de indústria e comércio, considerou-se necessário, em todos os países que conheceram um progresso notável, fazer uma gravação oficial naquelas determinadas quantidades de metal que se usavam comumente para comprar mercadorias. Daí a origem do dinheiro cunhado ou em moeda, entretanto, vale acentuar uma diferença importante, a moeda era o valor em si, diferente de hoje em dia que a moeda tem um valor numérico monetário independente do valor bruto ou peso, se hoje em dia uma moeda vale 50 centavos, na época a moeda era expressa em Kg e Quilates, entretanto, com o processo de cunhagem, passou-se a "dar nomes" a moedas, e assim surgiu a libra, onça, xerlins, e as demais.
"...Foi dessa maneira que em todas as nações civilizadas o dinheiro se transformou no instrumento universal de comércio, através do qual são compradas e vendidas ou trocadas entre si mercadorias de todos os tipos..."
Por fim, vale fazemos uma reflexão sobre o dinheiro, esquecendo de mitos quanto a sua maldade, o dinheiro é apenas um meio que serviu para facilitar o comércio, padronizar os valores e mensurar as mercadorias. Claro que, Smith analisou apenas o funcionamento do dinheiro até a publicação de sua obra, 1776, nos últimos 200 anos, o dinheiro evoluiu muito, mas sua essência é a mesma, apenas uma mercadoria como qualquer outra, e não algo divino com a atração do "um anel".

Embora Smith trate brevemente de uma questão análoga a "Inflação", não iremos tratar disto aqui, pretende-se fazer uma melhor análise futuramente da inflação e outros mecanismos e consequências do dinheiro.
No próximo artigo, adentraremos na teoria do valor de Adam Smith.

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